A inovação digital não diz respeito só à tecnologia. Antes de tudo, diz respeito a pessoas e seus comportamentos. O principal desafio para promover a inovação digital não está na tecnologia, mas sim na cultura organizacional, segundo 67% de executivos de organizações de médio e grande porte, de diversos segmentos ouvidos pelo Estudo Nacional sobre Evolução Digital e Inovação de Negócios, da empresa de tecnologia digital Meta e Fundação Dom Cabral. Atualizar a cultura faz parte da gestão da mudança. Para que a inovação aconteça, é preciso que a cultura organizacional permita.
Cada inovação, cada tecnologia adicionada, cada mudança implementada nos processos deve estar refletida no comportamento das pessoas, enraizadas na cultura da empresa. “Não é possível que aconteçam transformações de qualquer natureza, seja qual for a organização, que não envolvam uma profunda transformação cultural em sua essência”, afirmam José Salibi Neto e Sandro Magaldi, no livro “O novo código da cultura” (2019). A verdadeira transformação acontece nas e pelas pessoas. A tecnologia é apenas o meio para a isso, ela tangibiliza a capacidade que cada um têm de criar soluções diferentes para a sociedade.
Atualizar a cultura leva tempo, mas traz recompensa
As organizações estão tendo de revisitar constantemente seus processos, produtos, serviços, estratégias, tecnologias para acompanhar as mudanças no ambiente de negócios, nos comportamentos e consumo, e não devem negligenciar a cultura, alerta Salibi Neto, que é cofundador da HSM, empresa de educação executiva.
Um diagnóstico da cultura atual vai ajudar a entender se a empresa está trabalhando como deveria na nova economia ou segue vivendo em um ambiente que não existe mais. “No nosso entender, muitas cooperativas estão vivendo no mundo antigo, e não fizeram ainda a atualização cultural”, comenta Salibi Neto. “Hoje, é tudo mais rápido, e se não tiver uma cultura que suporta isso, a tendência é ser excluído do mercado”.
Renovar a cultura é um processo que exige dedicação e leva tempo até que as mudanças estejam enraizadas e passem a fazer parte do comportamento das pessoas no dia a dia. Mas, traz resultados. “A Microsoft, por exemplo, há menos de uma década valia 265 bilhões de dólares. Hoje, vale 2,6 trilhões de dólares, após a mudança cultural”, diz Salibi Neto.
Quase dois terços dos 500 executivos seniores de organizações ‘mais admiradas do mundo’ atribuíram 30% ou mais do valor de mercado das suas empresas à cultura, e um terço, 50% ou mais. Na visão desses executivos ouvidos pela Korn Ferry, empresa consultoria organizacional, a cultura é determinante para o sucesso futuro da empresa, mas, por vezes, é subestimada. Apesar de reconhecerem sua importância diante do mercado atual, menos da metade dos executivos estaria disposta a sacrificar o desempenho financeiro da empresa para reforçar a cultura. “É importante entender que atualização cultural é uma prioridade”, reforça Salibi Neto.
Atualização cultural começa pela liderança
“O que nos conecta é a nossa maneira de ser, e ela reverbera quando estou conversando com meu cliente, com a imprensa, com a comunidade. Nesse nosso convívio, cultura e identidade precisam estar muito fortalecidas. Se estamos falando de quem somos, e se aquilo não está mais nos satisfazendo, não está nos levando a buscar novos sonhos ou fazendo que a cooperativa evolua, é tempo de olhar para uma nova cooperativa, uma nova cultura”, aponta Marlene Marchiori, escritora, pesquisadora e palestrante nas áreas de comunicação e cultura.
Mudanças bem-sucedidas, em geral, são aquelas que foram iniciadas antes que a empresa sentisse o peso de manter uma cultura que já não condiz mais com a dinâmica da sociedade e do mercado. E todo esse movimento precisa começar pela alta administração, a partir do momento em que há o reconhecimento de que mudar é preciso.
É importante também que a liderança demonstre como as medidas contribuem para o sucesso da empresa, estimule as pessoas a fazerem parte e até mesmo contrate, com mais acurácia, profissionais com perfis que se encaixam à nova cultura. Desse modo, reduz o nível de resistência, aumenta o comprometimento das pessoas e estimula a inovação e o pensamento criativo.
Forte e ao mesmo tempo flexível
O Sicoob Divicred é um exemplo de cooperativa que entende a atualização cultural como tema essencial para o sucesso de suas iniciativas, que buscam promover adequações para atender a necessidades do mercado e das pessoas impactadas pelo seu trabalho. “Mantemos a nossa essência e buscamos nos adaptar aos novos desafios, incentivando a transformação digital e a inovação inerentes aos novos tempos”, assegura Urias Geraldo de Sousa, presidente do Conselho de Administração do Sicoob Divicred.
Engajar as pessoas e fortalecer a cultura são as questões fundamentais para a cooperativa. É a cultura que permite reforçar valores e consolidar práticas de cooperação. “Com isso, as nossas iniciativas são moldadas de forma multidisciplinar e dinâmica para fomentar o sentimento de pertencimento dos cooperados e dos colaboradores”, relata Sousa. Assim, “reforçamos a nossa missão de promover soluções e experiências inovadoras e sustentáveis por meio de cooperação”.
Para promover inovação, o Sicoob Divicred criou inclusive diretrizes que fomentam o intraempreendedorismo, de modo que todo o quadro funcional possa propor soluções de impacto interno e/ou externo. “Como exemplo, podemos destacar o novo modelo de atendimento digital ofertado aos nossos clientes e cooperados. Trata-se de um mecanismo inovador que oferece um atendimento seguro, prático e resolutivo. Essa nova prática reforça o compromisso da cooperativa em promover soluções de impacto na experiência de nossos usuários”, relata Sousa.
A essência sempre permanece
Desenvolver uma cultura organizacional mais flexível e adaptativa de forma alguma significa deixar de lado a essência do grupo. “Os elementos da cultura permanecem, os artefatos, os valores e normas, as crenças e pressupostos básicos, o que muda é a maneira como são encarados cada um deles, o jeito de fazer as coisas muda”, explica Salibi Neto.
E quando se fala em cultura, também se fala em identidade, imagem e reputação. Ela é algo que transcende todas as áreas da empresa e é percebida desde o relacionamento com os públicos (funcionários, parceiros, fornecedores, comunidade etc.), na comunicação, na apresentação dos produtos, na qualidade dos serviços, na experiência proporcionada ao cliente, até mesmo em sua estrutura física. Tudo isso diz quem a empresa é e como quer ser percebida e reconhecida, ensina Marlene Marchiroi. No processo de atualização cultural, sugere, “é muito interessante analisar como os públicos de relacionamento observam a empresa. A imagem organizacional vai trazer a dimensão se está havendo integração entre o quem somos e o como somos vistos. É preciso que haja essa conexão”.
Por Nara Chiquetti – Redação MundoCoop
Matéria exclusiva publicada na Revista MundoCoop, edição 114