Fernando Dewes é mestre e doutor em psicologia, com especialização em consultoria organizacional e neuropsicologia. Sempre teve interesse no cooperativismo pelo fato de ser filho de associado de uma cooperativa do ramo agropecuário; e durante a sua infância e parte da adolescência foi fortemente influenciado pela COSUEL, uma das cooperativas mais inovadoras do Rio Grande do Sul.
Por conta disso, Dewes desenvolveu dois estudos importantes, um sobre as questões relacionadas a teoria da agência nas organizações cooperativas e o outro sobre a personalidade do Líder e Governança Cooperativa.
A Mundo Coop conversou com o Fernando para entender um pouco mais sobre essas pesquisas e quais foram as suas descobertas.
Confira!
Por que resolveu fazer a pesquisa? O que pretendia entender? Quantas pessoas participaram?
Meu foco de estudo, ensino e pesquisa são os aspectos comportamentais no contexto de trabalho das organizações cooperativistas, especialmente aqueles relacionados a liderança. Meus primeiros estudos sistemáticos, resultaram em dois artigos, produzidos sob a orientação do professor e pesquisador Antônio Padula, do Programa de Pós-graduação em Agronegócio, UFRGS.
O primeiro deles, publicado em revista internacional, focalizou questões relacionadas a teoria da agência nas organizações cooperativas. Neste trabalho tivemos a oportunidade de perceber diferenças importantes entre as cooperativas e as empresas mercantis, que têm impacto na gestão e no comportamento dos seus líderes.
No segundo estudo, investigamos as características pessoais dos líderes de cooperativas. O objetivo da pesquisa foi o de identificar os traços da personalidade dos líderes, requeridos para o exercício da liderança no cooperativismo e propor, como formulação exploratória, um modelo de liderança voltado para o desenvolvimento de líderes no cooperativismo.
O objetivo era identificar, preliminarmente, características pessoais associadas a liderança de cooperativas, por isso foram entrevistados cinco presidentes de cooperativas do Rio Grande do Sul, sendo três do ramo agropecuário, uma do ramo trabalho e a outra do ramo crédito.
Nas entrevistas os participantes foram solicitados a responder a seguinte questão básica: “Quais são as características pessoais de um líder de cooperativa?” Posteriormente, as características por eles apontadas, foram submetidas a avaliação, e escolha das mais importantes, por 119 gestores de cooperativas dos mais variados ramos, sendo 54 presidentes ou diretores e 65 gerentes ou supervisores.
Quais as características dos entrevistados?
As características que apresentaram maiores Índices de concordância entre os participantes da pesquisa foram a habilidade de negociação, de observação e diplomacia, bem como a atitude de autoconfiança. O segundo conjunto de características mais importantes envolveu atitudes típicas de uma pessoa direta e objetiva, prática e rápida no agir. No terceiro conjunto aparecerem atitudes de expressividade, especialmente na comunicação pessoal, além de possuir conhecimentos relativos ao seu campo de atividade. Outras características também foram apontadas, mas com menor representatividade.
O que descobriram? Qual foi a constatação?
Uma das intenções desse estudo foi a de fornecer subsídios para a formulação de programas de formação e desenvolvimento de líderes para o cooperativismo. Intenção reafirmada pelos próprios participantes da pesquisa, ao serem questionados sobre a origem da liderança. A maior concordância obtida foi referente a afirmação, segundo a qual, o líder se faz através da educação e do treinamento, em contraposição àquela que afirmava que o líder já nascia feito e que a liderança é algo que a pessoa traz ao nascer.
Este resultado estimula os dirigentes e educadores no cooperativismo a prosseguirem nos seus esforços para a formação de novos líderes.
Qual tipo de líder é o mais indicado para as cooperativas?
O papel da liderança é essencial em qualquer organização. Seres humanos, assim como animais de várias espécies, vivem em grupo e todos eles necessitam e possuem líderes. Liderança é um fenômeno da natureza e fundamental para assegurar a sobrevivência dos indivíduos e das organizações. Portanto, não há como fugir da responsabilidade de formar bons líderes e aperfeiçoá-los continuamente.
Com relação a formação, sem dúvida, a oferta de cursos de pós-graduação em gestão de cooperativas, feita com o apoio direto do SESCOOP- RS, vem trazendo resultados animadores, contribuindo admiravelmente para elevar o grau de profissionalismo na gestão.
Mesmo assim, as cooperativas, independentemente do grau, devem intensificar a implementação de programas internos de desenvolvimento de lideranças. Uma cooperativa que já conta com um programa forte e consolidado é a COOTRAVIPA, que é uma importante referência nesse tema.
Como formar ou preparar os colaboradores ou cooperados em líderes adequados às cooperativas?
Ainda estamos longe de identificar, através do método científico, as características mais desejáveis para o exercício da liderança nas cooperativas e como eles se distinguem dos líderes nas empresas mercantis. Até porque no contexto de uma cooperativa, é comum a presença do associado e do colaborador, com vínculo empregatício. Cada um com suas demandas e características exigindo, por suposto, diferentes abordagens e formas de liderar. Habilidades relacionadas a negociação, diplomacia, comunicação e outras afins, são intensamente exigidas na interação do líder com os associados das cooperativas. Certamente essa é uma demanda mais discreta nas interações do líder com liderados em condição de vínculo de emprego e tal situação não se verifica nas empresas mercantis.
Também temos as cooperativas do ramo trabalho as quais, em sua maioria, não possuem empregados, somente associados. Os líderes de tais cooperativas atuam em um ambiente comportamental de alta complexidade, exigindo deles habilidades que não são igualmente requeridas em outros contextos.
Nesse sentido, estamos desenvolvendo estudos em busca de mais conhecimentos sobre esse tema e esperamos que os atuais e futuros pesquisadores se juntem anos, se voltando não somente para os aspectos técnicos, tecnológicos, contábeis e financeiros das cooperativas, mas, também, para as suas dimensões comportamentais.
Por Priscila de Paula – Redação MundoCoop