No mundo do trabalho, a saúde mental tem sido um tema preocupante, sobretudo quando o assunto é a síndrome de burnout.
O problema é sério, o Brasil, por exemplo, ocupa o segundo lugar no mundo em mais casos da síndrome, segundo um relatório da International Stress Management Association (Isma-BR – 2021). Ficando atrás apenas do Japão, que já tem um longo histórico de casos de crises pessoais relacionadas ao mundo corporativo.
Um levantamento feito pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), indicou que um em cada quatro brasileiros sofre com a síndrome de burnout. As mulheres são as suas maiores vítimas com 46%, contra os homens com 37%. A mesma pesquisa indicou que a faixa etária mais afetada pela doença são os funcionários com menos de 30 anos, em 48%.
Antônio César Marini, gerente de Gestão de pessoas da Coamo Agroindustrial Cooperativa conta que atualmente uma das maiores preocupações dos RH das cooperativas tem sido o burnout. “Ele é um distúrbio emocional com sintomas de exaustão extrema, estresse e esgotamento físico, resultante de situações de trabalho desgastante que demandam muita competitividade ou responsabilidade. A principal causa da doença é justamente o excesso de trabalho. Daí a necessidade de programas, políticas e gestores preparados para enfrentar essa questão”, conta.
Por isso, várias cooperativas têm investido em iniciativas que foquem no bem-estar e na saúde de seus colaboradores e cooperados, como é o caso do Programa Felicidade Interna do Cooperativismo (FIC).
Ariel Ruan dos Santos, analista de gestão de pessoas do Sicoob Credicapital, que desenvolve o Programa Felicidade Interna do Cooperativismo conta que nos dias de hoje o tema é de grande relevância. Dentro dessa filosofia, a cooperativa oferece bons salários, benefícios atrativos e o salário emocional, que envolve um ambiente harmonioso e pessoas engajadas. “Começamos com cursos, capacitações acerca do tema e a disseminação dela para toda a Cooperativa. Promovemos os treinamentos sobre saúde mental e como isso impacta no contexto integral do ser humano, além de ações voltadas ao bem-estar de fato, como festividades, flexibilizações de rotina e momentos de descontração para que possamos nos conectar além do profissional”, diz Ruan.
AS LIDERANÇAS
Nesse cenário, o fator liderança tem ganhado ainda mais importância e os especialistas chamam atenção para isso. No contexto das cooperativas, as relações entre os cooperados, associados, colaboradores e seus líderes precisa ser mais transparente e direta. “Muitos funcionários podem se sentir inseguros para compartilhar seus sentimentos com os superiores, por medo de retaliações”, lembra Silvia Rezende, especialista em terapia cognitiva comportamental.
Além dos relacionamentos, as cooperativas precisam estabelecer limites e definir horário de trabalho, em especial para os profissionais que trabalham em casa. “Em uma sociedade cada vez mais conectada, pode ser um desafio se desconectar do trabalho e se dedicar a outras áreas da vida Quando o horário de trabalho termina, é importante desligar o computador e evitar verificar e-mails ou mensagens de trabalho”, indica Rezende.
As lideranças das cooperativas também podem ajudar no uso saudável da tecnologia, estabelecendo uma cultura que valorize o equilíbrio entre o trabalho e a vida pessoal. “Isso pode ser feito por meio da implementação de políticas que promova uma carga de trabalho realista, estabeleçam horários de trabalho claros e respeitem o tempo de descanso dos colaboradores. Além disso, os líderes devem servir como exemplos, praticando eles próprios a desconexão e criando um ambiente de trabalho que valorize o bem-estar e a saúde mental dos colaboradores”, indica Madalena Feliciano, Empresária, CEO de Outliers Careers, IPCoaching e MF Terapias, consultora executiva de carreira e terapeuta.
O BURNOUT DIGITAL
Além dos projetos direcionados aos funcionários é importante criar meios para evitar e minimizar o burnout digital, problema que ocorre quando o funcionário não consegue se desconectar dos meios digitais.
O burnout digital é um estado de exaustão mental, emocional e física causado pelo uso excessivo da tecnologia e pela exposição constante às demandas digitais. Situação onde não se consegue estabelecer limites saudáveis entre trabalho e vida pessoal, quando estamos constantemente conectados e disponíveis, e quando não temos tempo suficiente para descansar e recarregar as energias. “Existem maneiras simples de lidar com essa questão, uma delas é estimular os colaboradores a darem espaços para os momentos de lazer e as atividades ao ar livre. O exercício físico não só ajuda a reduzir o estresse e a ansiedade, mas também melhora o humor e aumenta a sensação de bem-estar”, indica Madalena.
MUDANÇA DE CULTURA
As cooperativas devem estimular uma cultura que valorize o descanso e o bem-estar, reconhecendo que a produtividade não pode ser medida apenas pelo tempo gasto em frente às telas.
A psicóloga Tatiane Paula, que atua no setor, conta que muitas vezes faltam nas empresas e cooperativas suportes e políticas adequadas direcionadas a saúde mental e emocional. “Isso acaba contribuindo para a sensação de isolamento. Sobrecarga de trabalho e a falta de recursos apropriados intensificando a exaustão”, lembra Paula.
Segundo a especialista, a produtividade aumenta, uma vez que funcionários mentalmente saudáveis mantêm o foco e tomam decisões ponderadas. “Investir na saúde mental também resulta em economia a longo prazo, reduzindo custos associados a absenteísmo e rotatividade. A criatividade e inovação florescem em equipes com boa saúde mental. Flexibilidade no trabalho, políticas de licença e acesso facilitado a profissionais de saúde mental são medidas fundamentais. Campanhas de conscientização e criação de uma cultura inclusiva também promovem o bem-estar. Lidar com problemas de saúde mental requer sensibilidade. O investimento em saúde mental gera impactos duradouros”, finaliza a psicóloga.
Por Priscila de Paula – Matéria exclusiva publicada na Revista MundoCoop Edição 115