Ao subir no palco da última Conferência do Conselho Mundial das Cooperativas de Crédito, Elissa McCarter LaBorde, presidente e CEO da WOCCU, reforçou um pedido urgente para o cooperativismo mundial: mais união e sintonia. Em suas palavras, a CEO – que concedeu uma entrevista exclusiva à Revista MundoCoop na mais recente edição – lembrou que as cooperativas devem estreitar laços e fortalecer uma rede mundial de apoio ao setor.
Em uma resposta automática a esse pedido, replicado ano após ano, cooperativas do mundo todo tem buscado fortificar o diálogo entre si, derrubando barreiras geográficas e permitindo que o desejo de trazer mudanças fale mais alto, além de qualquer empecilho linguístico. Destaque nesse contexto, o Brasil tem despontado nessa agenda, olhando cada vez mais para fora e desenvolvendo ações que já resultam em acordos e parcerias.
De forma sistemática o país vem conquistando espaço, com representantes firmando importantes acordos de cooperação técnica. Fabíola Nader Motta, Gerente-Geral do Sistema OCB, aponta que o posicionamento do setor é um movimento natural, resultado de todo o trabalho feito até aqui. “Estamos certos de que a internacionalização de nossas cooperativas surge como um processo natural da evolução de seus negócios. À medida que crescem, as coops buscam oportunidades dentro e fora do país”, explica.
E complementa que, como órgão institucional máximo responsável pelo setor, o Sistema OCB tem atuado para fortalecer esse intercâmbio. “Ao Sistema OCB cabe a tarefa de cultivar relacionamentos e cooperação técnica com movimentos cooperativistas em outros países. Mantemos uma excelente cooperação com países como Alemanha, Argentina, Estados Unidos e Japão. Estamos atentos não somente às oportunidades de negócios, mas também às possíveis parcerias de troca de conhecimento. Além de desenvolvermos serviços para apoiar nossas cooperativas em sua trajetória de internacionalização, também desenvolvemos parcerias estratégicas para alavancar o processo”, completa.
Atualmente, a instituição que representa o cooperativismo brasileiro faz parte de 16 organizações internacionais relacionadas ao movimento, com o trabalho de representação internacional sendo liderado pelo presidente da OCB, Márcio Lopes de Freitas, por meio de sua participação nas reuniões do Conselho de Administração da Aliança Cooperativa Internacional, do qual faz parte.
Com a profissionalização das cooperativas e aumento exponencial em todos os índices do setor, o cooperativismo brasileiro tem visto sua imagem se destacar diante de outros países, ampliando assim sua voz e poder de “ter o seu voto”. Manfred Alfonso Dasenbrock, diretor da WOCCU e presidente da Central Sicredi PR/SP/RJ, explica que é nítido o papel que o Brasil representa no cooperativismo mundial, se destacando não apenas por seu faturamento e pioneirismo, mas também pelo seu capital intelectual nos ramos agropecuário, crédito e outros.
“Nas nossas trocas com membros do Conselho e de outras instituições cooperativas, observamos que o nosso modelo de organização em sistema é uma referência no mundo todo. Assim sendo, os acordos de intercooperação com outras instituições cooperativas internacionais é algo que acontece há alguns anos. Assim como temos muito a ensinar, para nós é gratificante poder aprender com as práticas desenvolvidas em outros países”, frisa Dasenbrock.
Com tal relevância para outros países, o Brasil tem sido o centro de diversas ações ao redor de todo o globo, com atuação em todos os continentes, levando o impacto social e humano do cooperativismo, para as comunidades mais remotas. “Nossa atuação internacional é multissegmentada. Ao mesmo tempo que apoiamos o desenvolvimento de cooperativas em países do Sul Global, tais como Argélia, Botsuana e Timor-Leste, nós também atuamos para receber cooperação de parceiros como a Alemanha. Por outro lado, também atuamos para prospectar oportunidades comerciais para nossas cooperativas”, reforça Fabíola.
Diante de um novo papel a desempenhar, rapidamente se mostrou necessário que as cooperativas, assim como outras instituições, fortalecessem seus pilares de modo que mais oportunidades fossem exploradas nos mais diversos contextos. “Sabemos da importância do cenário internacional para o fortalecimento do cooperativismo. Por isso, temos aprimorado nossa atuação nos principais fóruns de interesse do cooperativismo. Estamos atentos às necessidades e oportunidades para nossas coops, e buscamos apoiar a propagação do modelo cooperativista como instrumento de desenvolvimento internacional”, completa Fabíola.
Oportunidade ou necessidade?
Com diversas estratégias a serem perseguidas, muitas vezes planos que são moldados conforme os contextos vão se modificando e se solidificando. Contudo, no que se refere à relação do cooperativismo brasileiro com outros países, a relação que vem se solidificando nos últimos anos, parte de uma série de oportunidades, criadas a partir do avanço do setor e consequentemente, reconhecimento por parte de organizações e lideranças mundiais. Tal alinhamento de posições, com o reconhecimento externo e a resposta do país à essa imagem positiva amplamente compartilhada por organizações internacionais, o cooperativismo vive um momento em que suas estratégias são estruturadas para tirar o proveito máxima das oportunidades que se materializam.
Para Dasenbrock, a abertura para outros países foi um movimento natural, e abre caminho para que a troca de experiências possa ampliar os negócios e projetos de todos os envolvidos. “Mais do que “inevitável”, a intercooperação entre cooperativas de diferentes países é fundamental, pois nos fortalece enquanto sistema e garante nossa unicidade. Isso fará com que o segmento seja cada vez mais conhecido, chegue a mais pessoas e siga beneficiando cada vez mais comunidades ao redor do mundo”, destaca.
Mesmo com fortes diferenças culturais, o cooperativismo é – desde a sua origem – um movimento com valores, propósitos e princípios bem definidos. E em cada parte do globo, cada qual o seu contexto, as cooperativas se moldam para sempre adquirir conhecimento das comunidades, para então, devolver soluções personalizadas e que realmente tragam benefícios mensuráveis e atingíveis. Com isso, elementos comuns à toda a humanidade, se tornam a “liga” para que tais cooperativas saibam onde explorar as oportunidades.
“Por meio do diálogo, vemos que cada cooperativa tem suas particularidades, mas, ao mesmo tempo, há desafios comuns entre os integrantes do Conselho. O movimento global das cooperativas de crédito, por exemplo, ainda precisa avançar em questões como digitalização, diversidade e inclusão financeira. Temos desafios similares envolvendo o futuro do trabalho e como tornar o ramo cada vez mais conhecido. É por meio da troca de experiências que conseguimos entender como estamos avançando em diferentes aspectos e descobrindo como podemos ser melhores”, completa Dasenbrock.
Em exemplos recentes dessas oportunidades, o Sicredi firmou um importante acordo de cooperação técnica com a Federação de Cooperativas da Colômbia. Com o objetivo de promover ações voltadas à liderança de jovens e de mulheres dos sistemas cooperativos, a parceria busca replicar um modelo de sucesso no Brasil: os Comitês de Mulheres e Jovens, responsáveis por avanços no desenvolvimento desses grupos e inclusão em cargos de liderança. Em outra ocasião, a Unicred União realizou um importante intercâmbio com o cooperativismo alemão, onde as cooperativas do setor atendem não apenas associados, mas outras pessoas também. Em entrevista ao podcast da MundoCoop, o Papo Coop, Maysse Paes Honorato – Gerente de Comunicação da Unicred União – reforçou a importância de conhecer o cooperativismo de outros países. “Conhecer outras culturas é enriquecedor. Conhecer modelos de cooperativismo de todo o mundo vai de encontro com os nossos valores, resultando em ações que evidenciem o que o setor de melhor a oferecer”, afirmou.
Inciativas como a do Sicredi e da Unicred, mostram na prática um movimento que cada vez mais, ganham espaço no cooperativismo brasileiro. Seja nas lideranças ou entre os próprios cooperados, a compreensão de que uma cooperação duradoura e contínua pode trazer inúmeros benefícios para as comunidades e o movimento como um todo, mostra que as cooperativas vivem um novo momento, onde as iniciativas internas e externas compartilham espaço diariamente. Para Fabíola, essa realidade onde as ações saem da teoria e se materializam em ações concretas e compartilhadas entre os países, é o caminho ideal para uma cooperação efetiva e duradoura, sendo primordial para a manutenção do movimento. “É muito importante que o cooperativismo tenha uma voz unificada em todo o mundo, e vital que a intercooperação se torne uma forma de ampliar os negócios de cooperativas em diferentes países”, frisa.
Somado aos avanços possíveis através da cooperação técnica, a criação de uma rede mundial de cooperativas tem a capacidade de reafirmar a identidade cooperativa, tornando possível que estratégias conjuntas possam ajudar a ratificar a imagem do setor, atraindo mais pessoas e expandindo sua capacidade de impacto nas economias mundiais. Através disso, o setor pode comemorar uma unificação nunca antes vista, abrindo possibilidades para um cooperativismo mais resiliente, pronto para ocupar novos espaços. “A cooperação internacional permite a troca de conhecimento, de experiências e, principalmente, gera unicidade. Afinal, estamos todos juntos trabalhando para promover a inclusão financeira, visando o avanço em questões como digitalização, diversidade e avanços climáticos. Principalmente, compartilhamos do desafio de tornar o cooperativismo conhecido no mundo todo, fazendo com que as pessoas entendam os nossos diferenciais e os benefícios de serem nossos associados”, afirma Dasenbrock.
Com um diálogo mais fortalecido, o próximo passo para essa intercooperação global é tornar casos isolados em iniciativas diárias e inerentes ao movimento. Tudo isso, através de pequenas práticas: seja recendo e apresentando o cooperativismo nacional para delegações internacionais ou ainda, promovendo uma cadeia de produção onde exportações e importações de produtos de cooperados, possa expandir os negócios do setor em todas as esferas.
Para esse fortalecimento geral, fortalecer a comunicação e ter lideranças dispostas a encarar o desafio de criar uma agenda contínua, será essencial para o movimento visto hoje, se multiplique e continue gerando frutos. Intercooperar dentro do Brasil é urgente, e necessário. Buscar isso fora, é um próximo degrau capaz de trazer benefícios inimagináveis. “A intercooperação tem se mostrado uma estratégia eficaz para os negócios internacionais. Temos que ficar atentos para as novas demandas de consumo e suas amplas oportunidades para o cooperativismo brasileiro, e devemos trabalhar fortemente para que as cooperativas brasileiras se beneficiem das oportunidades de atuação conjunta com cooperativas em outros países”, finaliza Fabíola Motta.
Por Leonardo César – Redação MundoCoop
Matéria exclusiva publicada na edição 113 da Revista MundoCoop