O Brasil sempre foi um grande produtor agrícola. Mas o Agro vem ganhando uma importância cultural crescente há alguns anos. Ganhar importância cultural significa pautar discussões que são relevantes no ambiente de negócios e na sociedade de modo geral. Os sinais estão aí: cada vez mais as discussões sobre safras e preços de insumos do Agro preenchem notícias de economia. Os cantores sertanejos continuam a ter enorme influência na cena cultural. A temática Agro está presente em obras e programas de apelo popular – como Pantanal, a reexibição de Rei do Gado, e até nos participantes do BBB.
O Agro ganhou ainda mais impacto com a pandemia. Enquanto a maioria dos negócios teve paradas bruscas, o Agro cresceu. Esse aumento da relevância traz consigo investimentos que acabam por consolidar o mercado: investidores e empresas maiores passam a comprar empresas menores, aumentando a maturidade do mercado como um todo e criando maior complexidade nos processos de busca por vendas e diferenciação. Se antes o aumento da produtividade, uma solução logística ou o incremento da equipe de vendas era suficiente para a expansão de um negócio no Agro, agora é preciso técnicas e ferramentas mais sofisticadas de gestão.
O rápido aumento da rentabilidade nesse momento é fundamental. Afinal, se uma empresa num cenário de consolidação se enfraquece, ela terá que reduzir investimentos, irá perder mercado e eventualmente sucumbirá aos concorrentes ou será comprada por um deles. Isso aconteceu em alguns mercados digitais mais recentemente, e aconteceu nos bens de consumo décadas atrás. O Agro agora é a bola da vez.
Uma maior competitividade leva a uma necessidade de buscar diferenciação. Essa diferenciação deverá vir de produtos melhores, serviços melhores, mas também pode vir de marcas que conseguem adicionar valor aos negócios. O Agro sempre foi um mercado de commodities, mas para evitar esse processo cruel de preço por quantidade baseado em oferta e demanda, é preciso fazer o que outros mercados fizeram: desenvolver mais e novos tipos de diferenciação. Temos percebido esse aumento de demanda em alguns projetos, especialmente:
- Busca por diferenciação no produto final: a cadeia do agro é composta, especialmente, por commodities. As safras de soja, milho, feijão, algodão, açúcar, carne de frango ou gado são cotados em bolsa de valores. No entanto, há oportunidades de mercado para adicionar valor aos produtos através de estratégias de novos produtos ou marcas. O mercado de carne bovina é um bom exemplo, com carnes especiais sendo vendidas com marcas específicas com valores por quilo bastante superiores aos preços “normais”. Nesse caso, as marcas explicitam as diferenças de qualidade e garantem um padrão acima da média do setor, adicionando valor. Recentemente percebemos essa demanda num projeto feito para a ABS Global, multinacional do setor de genética bovina.
- Busca por diminuir comoditização em produtos da cadeia produtiva: os insumos básicos do agro são vistos como commodities. Fertilizantes, defensivos agrícolas, vacinas e medicamentos, salvo poucas opções, normalmente de marcas internacionais, são percebidos como commodities e a briga por preço é muito intensa. Nesse caso, investimentos em desenvolvimento de produtos, oferta de serviços e construção de marca leva à uma maior confiabilidade e relacionamentos mais intensos. O grupo Nitro recentemente entrou no mercado Agro comprando e consolidando empresas e precisou olhar para como construir diferenciação que suportasse vendas mais constantes e preços mais adequados.
Isso não é novidade para todo o agro. Máquinas agrícolas e fabricantes multinacionais de defensivos e medicamentos há décadas constroem suas marcas. Mas a busca por diferenciação só deve aumentar nos próximos anos, fruto do aumento da competição, em todos os mercados do complexo agroindustrial.
A competição desse mercado não se dará apenas na busca por clientes e maior volume de vendas. Ela também se dará em outras áreas, como na busca por recursos humanos. Com empresas maiores, fruto de fusões e aquisições, cargos mais especializados e complexos serão demandados.
Pessoas com esse nível de expertise no Agro podem ser escassas, e a disputa por talentos demandará esforços de “Employer Branding” através do desenvolvimento e comunicação efetiva dos propósitos e valores das organizações que ajudem as empresas a engajarem formandos e especialistas nas vagas que serão abertas. O recente lançamento da Harven Agribusiness School, parceria da consultoria Markestrat com o grupo SEB é um indicativo da necessidade de formar e treinar pessoas para o Agronegócio. E um indício da importância de uma estratégia de marca corporativa bem estruturada para poder se tornar atraente para esses novos profissionais.
Além disso, com a especialização do mercado, organizações há muito presentes no Agro, como as cooperativas agrícolas, também terão que se atualizar. Além de aumentar o hall de seus serviços para seus associados, elas deverão poder agregá-los numa visão e propósito comum, que caminhem de maneira integrada para a geração de valor. Isso demanda uma marca estruturada que indique para os associados a melhor forma de gerar valor naquela cultura, naquela região. As cooperativas também podem ser responsáveis por criar diferenciação para os produtos produzidos por aqueles produtores, naquela região. Produtores de queijo da serra da canastra são referência nesse tipo de esforço coordenado para geração de valor, no caso usando técnicas de “Place Branding”. Mas produtores de carnes do Sul e áreas do Centro Oeste, produtores de frutas no Nordeste, e até produtores de vinho no vale do São Francisco são exemplos de grupos que podem criar valor pela união dos produtores regionais. Em alguns desses casos, as cooperativas já estão organizadas. Falta gerar poder de marca com ações coordenadas para vendas melhores no mercado nacional e internacional.
Uma leitura menos atenta desse texto pode fazer parecer que estou indicando problemas. Mas é exatamente o contrário. Áreas que crescem trazem oportunidades. E é de oportunidades que falamos aqui. Que todos nós possamos contribuir para um Agro que cada vez mais adicione valor ao Brasil.
*Marcos Bedendo é professor de branding e marketing da ESPM-SP