As carteiras das três maiores cooperativas de crédito que atuam no agronegócio devem aumentar significativamente na safra 2023/24, a despeito das intempéries e desafios enfrentados pelos agricultores. Crescem abocanhando fatias de mercado que pertenciam às instituições financeiras tradicionais até poucas safras.
Na semana passada, o diretor financeiro do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Alexandre Abreu, disse que as cooperativas de crédito estão provocando uma “revolução silenciosa”. Nas feiras agrícolas, porém, essas organizações disputam atenção lado a lado com gigantes, como o Banco do Brasil.
“A gente cresce na crise”, afirma Gustavo Freitas, diretor-executivo de crédito do Sicredi, a maior cooperativa de crédito rural do país, em entrevista à reportagem, durante a Show Rural Coopavel, realizada em Cascavel (PR).
Na safra 2023/24, o Sicredi esperava emprestar quase R$ 60 bilhões ao setor, um aumento de 17% em relação à temporada passada. O crescimento até agora está mais próximo dos 10% — ainda um bom volume, dadas as circunstâncias atuais.
Freitas observa que a combinação de preços das commodities agrícolas em queda, taxas de juros elevadas e a quebra da safra de soja faz o produtor rural pensar duas vezes antes de investir. Segundo ele, os agricultores esperavam que os efeitos do El Niño fossem mais pontuais, mas o fenômeno se mostrou mais disseminado e aleatório.
Mas, para o diretor do Sicredi, parte dos investimentos represados pode deslanchar nos próximos meses, à medida em que a taxa básica de juros recue. “Quando o Plano Safra atual foi anunciado, a Selic estava perto de 12%. No próximo [Plano Safra 2024/25], deve estar mais perto de 10%. Faz uma diferença enorme para o produtor”, afirma.
O Sicredi espera concluir o ciclo com 320 mil contratos fechados, sendo que mais de 90% com pequenos agricultores, que ficam com 60% do volume de recursos. Apesar do grande volume de transações, a inadimplência é baixa — de menos de 0,5% — por conta do relacionamento direto que a cooperativa tem com os clientes, segundo Freitas.
No Sicoob, segunda maior cooperativa de crédito no agronegócio, a percepção é a de que a demanda por recursos para custeio continua firme apesar da quebra da safra porque, apesar da dificuldade, o produtor não vai deixar de produzir. A instituição projeta aumentar a oferta de crédito em 33%, para R$ 52 bilhões neste ciclo.
“O produtor está mais reticente, sim, em fazer substituição de maquinário”, pondera Carlos Schlick, diretor de mercado do Sicoob Central Unicoob. Segundo ele, conforme a colheita da soja avança e o agricultor começa a ter uma noção melhor do tamanho da margem, é possível que os negócios voltem a acontecer com mais força.
Para a cooperativa, uma vantagem é a carteira bem equalizada entre os níveis de produtores: pequenos e médios ficam com 30% dos recursos, enquanto os grandes levam 40%. Como os grandes produtores tendem a sofrer menos em momentos de crise, a taxa de juros de inadimplência também segue sob controle, ao redor de 0,35%, afirma Schlick.
Terceira colocada no ranking das cooperativas de crédito que atendem o agronegócio, a Cresol emprestou 60% dos R$ 15 bilhões previstos para a temporada. Na safra 2022/23, os financiamentos somaram R$ 8,3 bilhões.
De acordo com Adriano Michelon, vice-presidente Cresol Confederação, o ritmo de execução no primeiro semestre da temporada ficou dentro do esperado, mas, com as incertezas em relação à safra, é possível que o resultado final fique em 85% da meta, ou quase R$ 13 bilhões.
A médio prazo, Michelon avalia que a normalização dos preços agrícolas e a redução dos juros podem acalmar os ânimos e diz que o produtor brasileiro já sabia que as margens dos últimos anos tinham sido atípicas. “Agora devem estabilizar e se equilibrar”, afirma
Nos primeiros seis meses da safra 2023/24, o Banco do Brasil, principal operador de crédito rural do país, emprestou R$ 120 bilhões, um aumento de aproximadamente 5% em comparação ao mesmo intervalo de meses do ciclo anterior. Mas a fatia do banco — que já foi responsável por 90% do total — caiu para 50% nos últimos dez anos, segundo Michelon. “A revolução silenciosa surge dessa relação mais próxima com a base”, afirma.