Acelerar o acesso a ferramentas que mensurem as emissões dos gases de efeito estufa e incentivar a adoção de boas práticas que promovam o aumento da produtividade e o sequestro de carbono são maneiras eficientes para a inserção do público cooperativista no tema. Esta premissa foi evidenciada no painel O papel do Brasil para a descarbonização global: oportunidades para o coop, da Semana de Competitividade do Cooperativismo 2023. Seja na redução dos impactos na cadeia produtiva do agronegócio ou na produção energética renovável, a participação do cooperativismo é considerada primordial para o alcance das metas estabelecidas na Conferência das Partes das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas.
A gerente de Desenvolvimento de Cooperativas, Débora Ingrisano, divulgou, durante o painel, a Solução Neutralidade de Carbono, iniciativa idealizada pelo Sistema OCB para auxiliar o cooperativismo a ser protagonista no tema. “Essa solução tem o objetivo de apoiar as cooperativas nas ações de inventariar e monitorar as emissões de gases de efeito estufa em suas atividades, visando conhecer a pegada de carbono e adotar soluções para reduzi-las e até neutralizá-las. Tudo isso baseado em metodologia mundialmente reconhecida. O projeto Neutralidade de Carbono está em fase piloto e em 2024 estará disponível para todo o país”, descreveu.
Talita Priscila, pesquisadora do Observatório de Bioeconomia da FGV, fez uma correlação histórica do crescimento populacional e exploração dos recursos naturais, apontando que a soma das ações em períodos como a Revolução Industrial contribuíram de forma considerável para o aquecimento global. “Nos últimos 50 anos vimos uma degradação dramática do capital natural do planeta. Sabemos que a temperatura oscila e temos picos de frio e de calor, mas a concentração de dióxido de carbono só cresce por causa do padrão de desenvolvimento da população global”, alertou a doutora.
Eduardo Assad, especialista em mudanças climáticas e seus impactos na agricultura, destacou que as maiores emissões brasileiras são respectivamente decorrentes da mudança do uso da terra (desmatamento ilegal e queimadas) e da produção agropecuária. Ele detalhou o histórico dos alertas sobre o aumento da temperatura do planeta. Para Assad, a inação pode resultar em uma emissão de gases anual de 3 mil gigatoneladas. “É preciso entender que as altas temperaturas trazem inúmeros prejuízos. Por exemplo, o clima quente em 32% acima do normal inviabiliza a produção de café e laranja em regiões tradicionais dessas culturas. As perdas ambientais e financeiras já são enormes”, exemplificou.
O pesquisador também pontuou algumas medidas para aliviar e reverter este quadro. “Não podemos desmatar mais, e precisamos fazer um manejo sustentável, com adoção de tecnologias de baixa emissão de carbono e incentivar a pesquisa e o consumo de biocombustíveis”. Ele explicou ainda que, na criação de gado, a recuperação das áreas degradadas pode remover até 160 milhões de toneladas de gases. Essa prática consorciada com o plantio da soja traz ganhos de produtividade, podendo chegar a duplicá-la. “Os sistemas integrados são a chave para mudar a realidade e proporcionar até três safras por ano, integrando grãos, madeira e gado. Além disso, o balanço de emissões acumuladas da soja sob o sistema de plantio direto entre 2021 e 2030 gerará um saldo positivo e enriquecerá o solo. Esse balanço é factível, porque já temos conhecimento tecnológico e estamos inserindo o pequeno e o médio produtor nessas tecnologias”, evidenciou.
Coop reconhece protagonismo na pauta
O movimento cooperativista brasileiro está atento às tendências de mercado e, embora o respeito ambiental, o cuidado social e a boa governança façam parte dos valores e princípios do coop, o Sistema OCB tem estimulado as cooperativas a realizarem análises específicas para mensurar, com indicadores internacionais, as práticas constantes na pauta ESG. O fato motivou a criação e aplicação de diagnóstico no contexto do Programa ESGCoop.
De acordo com Ingrisano, algumas cooperativas já realizaram o diagnóstico e os resultados positivos já começaram a ser registrados. “Estamos mapeando as boas práticas, medindo impactos de acordo com indicadores qualificados, formando lideranças técnicas e estratégicas para, então, compartilhar, desenvolver e implementar soluções em consonância com os critérios ESG em todo o coop brasileiro. Temos muito a contribuir, uma vez que a sustentabilidade do nosso modelo de negócios está estruturada com base na viabilidade econômica, na justiça social e no cuidado com o meio ambiente. O cooperativismo nasce e vive das comunidades”, descreveu.
O diagnóstico piloto foi realizado com 365 cooperativas de nove estados e de diversos ramos. Segundo Débora, a aderência geral foi de 51,37% (valor máximo 100%) para as 99 perguntas apresentadas nas dimensões social, ambiental e de governança. “É um percentual significativo se considerarmos que o assunto é extremamente complexo, com novas temáticas e critérios ainda sendo discutidos. O tema ESG está efetivamente na pauta dos cooperativistas, tanto que 71% das coops participantes têm conhecimento sobre o tema”, relatou Débora.
A especialista em Sustentabilidade, Finanças Sustentáveis e Inteligência de Mercado no Agronegócio, Rosilene Rosado também participou da plenária e fez recomendações importantes sobre a agenda ESG. A primeira tratou da relação com a cadeia produtiva e o valor dos negócios. “Os atores envolvidos precisam adotar condutas similares às adotadas pela cooperativa no âmbito das práticas ESG. Dessa forma, assume-se compromissos que se desdobram para todos os fornecedores para, de forma estratégica e estruturada, mitigar riscos climáticos, operacionais e de mercado”. Neste quesito da cadeia de valor, ela apontou que o diagnóstico piloto identificou uma pontuação geral superior a 51%.
Em relação à biodiversidade, a consultora destacou que os resultados mostraram que já existe boa percepção sobre as perdas nas atividades que dependem dos recursos naturais. O montante de US$ 58 trilhões do PIB global, segundo ela, é dependente da biodiversidade. “O mundo está atento ao valor global do mercado anual de culturas que são polinizadas e estimadas entre US$ 235 e US$ 577, ao ano. Esse intervalo se dá pela variedade de cultura. Os cinco setores mais afetados são o agro, florestal, alimentação, tabaco, construção civil, pesca e aquicultura”. A aderência nesse quesito foi de 48%.
No que diz respeito às mudanças climáticas, o diagnóstico identificou que as coops precisam dar mais atenção ao tema. “É preciso pensar soluções nesse sentido. A energia limpa, por exemplo, é mais que reduzir emissões e adotar modelos mais sustentáveis. Todas as áreas estão interligadas e é preciso observar com cuidado para não deixar a desejar”, declarou Rosilene. A preocupação com o bom uso do solo, a recuperação de áreas degradadas, a gestão correta de resíduos e adoção de embalagens biodegradáveis também foram temáticas abordadas pela consultora.
Sobre inclusão, diversidade e equidade, o diagnóstico apontou 47% de aderência. “Os direitos humanos estão na pauta mundial e vão continuar porque se trata de um pilar da sustentabilidade social. Estamos falando da preservação de direitos e garantias. Então na cadeia de fornecedores é preciso lembrar da mão de obra e ver se o parceiro exerce conduta responsável”, acrescentou Rosilene. Outros resultados do estudo mostraram 44% de aderência das coops na análise de impacto e 33% no que diz respeito à materialidade.
Rosilene concluiu sua apresentação lembrando que as Nações Unidas afirmam que o mundo vê as cooperativas como atores-chave no alcance do desenvolvimento sustentável. “A cada 10 brasileiros um é cooperado, o que reforça o compromisso. Temos um modelo de negócios com muitos diferenciais que impactam positivamente o meio ambiente, a economia e a vida das pessoas. Somos agentes transformadores.”, finalizou.
Débora lembrou ainda que as principais contribuição do cooperativismo para o ESG são mostrar para a sociedade que uma organização empreendedora e orientada para resultados pode ser economicamente viável, ambientalmente correta e socialmente justa. “Queremos mostrar que podemos ser e fazer tudo isso em um modelo de gestão democrática que, desde a sua origem histórica, não deixa ninguém para trás. Com esses indicadores qualificados de performance, vamos mostrar que o Planeta é Coop!”.
Fonte: Cooperação Ambiental